O Amor

Seria tão bom sair por aquela porta e conhecer alguém sem precisar
procurar no meio da multidão. Alguém que soubesse se aproximar sem ser
invasivo ou que não se esforçasse tanto para parecer interessante.
Alguém de quem eu não quisesse fugir quando a intimidade derrubasse
nossas máscaras, que segurasse minha mão e tocasse meu coração. Que não
me prendesse, não me limitasse, não me mudasse, alguém que me roubasse
um beijo no meio de uma briga e me tirasse a razão sem que isso me
ameaçasse. Que me dissesse que
eu canto mal, que eu falo demais e que risse das vezes em que eu fosse
desastrada. Alguém de quem eu não precisasse.. mas com quem eu quisesse
estar sem motivo certo. Alguém com qualidades e defeitos suportáveis,
que eu não conseguisse olhar em outra direção. Que me encontrasse até
quando eu tento desesperadamente me esconder do mundo. Eu queria sair
por aquela porta e conhecer alguém imperfeito, mas feito pra mim....



segunda-feira, 9 de maio de 2011

Criando uma mente saudável



A Criança e os Pensamentos Negativos

 

Uma mente cujo conteúdo ainda não pertence a nenhuma crença, ou tradição, ou senso do que é errado ou certo, assim é uma mente infantil. Bandido e mocinho é coisa de adulto. Para uma criança a origem daquilo que vai aprender a imitar, pouco importa, pois a lógica do que convém ou não, nela ainda não existe.
Como uma esponja, com extraordinário poder de absorção, assim é também a mente fresca de uma criança. Seus sentidos extremamente apurados, mais que o de qualquer adulto, captam tudo à sua volta, com a mesma voracidade que um animal faminto se atira sobre sua primeira refeição do dia. É uma estratégia da natureza, uma vez que uma mente humana, por ser muito mais complexa que de qualquer animal, precisa de grande flexibilidade e muita informação.

Assim ela é capaz de aprender mais de uma coisa simultaneamente, depois de memorizar cada particularidade, de cada uma delas, requisito essencial para a etapa seguinte, que é a construção de um formidável banco de memórias. Graças a essa característica, única no reino animal, a criança mais tarde será capaz de deduzir, o que quer dizer, pensar de forma organizada, lógica, e a partir daí planejar e agir.
  Nessa disposição ímpar para aprender, ela é capaz de assimilar qualquer coisa, inclusive as más influências e os estados emocionais negativos dos adultos, especialmente os entes mais próximos. E, sem saber separar o que convém daquilo que não convém, acaba por incorporar tudo que consegue captar, ao seu padrão de pensamento, que logo se transformará em sua personalidade.

Desse modo, pode surgir uma personalidade que vislumbra as possibilidades negativas ou as positivas, de cada situação ou circunstância. Terá ou não uma predisposição para julgar tudo pelo lado pessimista ou otimista. Poderá crescer com a certeza de que se dará mal ou bem na vida adulta. Ao seu lado, como parte integrante e operacional do seu modo de ser, poderá ter um sistema emocional que facilmente sucumbe às adversidades, ou o seu contrário, uma forte disposição a enfrentar com altivez cada uma delas.

Lembre-se, que tudo isso são formas especificas de pensar, e consequentemente, agir. Assim, isso ela aprende, do mundo à sua volta, dos seus influenciadores mais próximos. Se apreende através da imitação, se assimila, se grava em sua memória como coisa válida, será porque alguém a ensinou, e esse alguém, nesses primeiros estágios de sua vida, é provável que sejam os seus entes mais próximos.

Do mesmo modo, o otimismo, também se aprende, e a regra é a mesma daquela que é válida para a capacitação anterior. Sim, pois trata-se de uma capacitação, que podemos chamar de habilidade. Uma capacitação, não reflete apenas boas condutas ou comportamentos produtivos, pois, um mau hábito, também é uma capacitação, uma habilidade que foi desenvolvida.

Assim, a criança pode se tornar um mestre em pessimismo, ou em otimismo, e tudo isso depende daquele, ou daqueles que o ensinam, de forma indireta ou direta. Quando uma mãe ou pai senta-se com ela para ajudar nas tarefas de casa, isso é instrução, e isso tem, nessa fase de suas vidas, pouco valor. Mas, ao contrário, suas condutas diárias, seu modo de relacionar-se com as pessoas e situações, o modo de falar, os hábitos, as queixas, estes são de longe as coisas mais importantes na educação indireta dessa criança.

Uma queixa seguida do estado emocional próprio, irritação, intolerância, agitação, gestos de violência, também prepara, instrui o emocional dessa criança a agir da mesma forma. Quando a impaciência e seus efeitos emocionais tomam conta de nossas ações e nos descontrolamos, tais comportamentos são de longe, os melhores instrutores desse novo personagem que ainda busca bagagem para construir sua personalidade.

Não tem ela, a criança, como separar aquilo que julgamos coisa inválida da válida, uma vez que ela ainda não sabe pensar de forma lógica. Mas, imitar até gradualmente atingir à perfeição, isso ela já é capaz de fazer. E assim, aos poucos, pelo exemplo diário, ela se aperfeiçoa, e finalmente seu sistema emocional se adequa, aprende a reproduzir na íntegra, as pantomimas dos mestres que estão à sua volta.

Finalmente, devemos estar cientes, que uma personalidade não é uma dádiva da natureza, mas da sociedade. A natureza não cria personalidades, mas antes disso, apenas a capacidade de imitarmos uns aos outros. Desse modo, psicologicamente, nós criamos os personagens que serão nossos filhos, e não a misteriosa natureza que nos deu o dom da vida. A natureza detentora do dom da vida, não cria as personalidades ou as preferências que possui cada indivíduo, isso é papel da mente social do meio onde vivemos, da sociedade, da qual somos parte integrante.

Lembre-se, instrução é toda informação que orienta o outro como fazer determinada coisa, e para uma criança, isso não importa a origem. Se vem do bandido ou do mocinho, para ela pouco importa, pois a informação é a única coisa que sua mente fresca, ávida por qualquer coisa, considera relevante.

As Frustrações Infantis
 

A angústia infantil, herdada do adulto, é uma qualificação como outra qualquer. É pura instrução passada de pais para filhos, numa cadeia de repetição interminável, sem uma origem identificável, sem um fim previsível...
Educador não deveria ser aquele que simplesmente instrui; que ensina qualquer coisa. Pode ser um mau hábito ou um bom hábito, ambos são conhecimentos. Um instrutor normalmente faz isso, é um multiplicador do conhecimento. Pode ser uma experiência pessoal, ou uma tradição milenar, ambas são instruções.

Um livro pode se tornar um eficaz educador, assim como um mito, uma crença, um tabu, uma propaganda que pretenda criar novos hábitos de consumo, ou novos estilos de comportamento, e todos estes podem ser chamados de instrutores. Se aquilo o que se prestam a ensinar é coisa inútil ou útil, isso é outra história, o que não anula seu papel de preceptor, de professor. A maioria dos chamados "professores" do mundo são assim.
  Quando observamos o viver da humanidade, suas formas de convívio social, suas angústias coletivas e individuais, os meios que criam suas ansiedades, seus medos, suas vaidades e ganâncias, coisas que são partes da sua extensa cadeia de problemas existenciais, não podemos negar que tudo isso também faz parte do seu conhecimento acumulado, desde as primeiras gerações.

E como este conhecimento formata, dá origem ao conteúdo da mente dos novos indivíduos, que por sua vez dão forma a essa mesma humanidade, podemos afirmar que o mundo é nosso principal instrutor. Ele se manifesta através de nós, seu pensamento é nosso pensamento, suas necessidades são também as nossas, assim como seus objetivos existenciais, e tudo o mais.

E o mundo repassa então seu conhecimento para seus filhos. E se esse mundo não caminha em nenhuma direção coerente, também esse será nosso destino. E através de nós, seu pensamento se transforma em ação, e através de nós seu pensamento poderá permanecer inalterado, ou talvez, ser mudado.

E eis que surgem nossos filhos, os adultos do futuro, como livros com folhas em branco, folhas nas quais podemos escrever qualquer coisa, até nossas frustrações e medos mais ocultos. Também nossos desejos e vaidades, nossos desafetos e afetos, parte da nossa personalidade. Eles não podem evitar que isso se cumpra, mas, como educadores ou pais, se estivermos cientes desse fato, podemos alterar essa escrita.

A sensação de não se ter um desejo realizado, um resultado idealizado e planejado diferente do esperado, esse é o sentimento que conhecemos como frustração. Claro que crianças, pelo menos as bem pequenas, ainda não sabem o que é isso, pelo menos não conhecem as muitas causas capazes de despertar tal sentimento.

Embora o sentimento de frustração seja coisa inata, e para as razões do instinto de sobrevivência de cada um, seja coisa bastante útil e necessária, nós, como seres racionais, lhe damos um fim bem diferente da coisa original. Sentimento de frustração, o original, é coisa do instinto. Serve para nos alertar dos perigos, das coisas que podem colocar em risco nossa integridade física. Isso nos faz chorar quando estamos com fome, no berço, longe de nossa mãe, e assim por diante.

Se essa frustração primária é coisa inata, a frustração do adulto, criada a partir dos obstáculos ante à realização dos seus desejos, das insatisfações criadas pelo seu pensamento, sempre que não é capaz de ver concretizada uma vontade sua, mesmo que seja simples capricho, esta, é de sua inteira autoria e responsabilidade.

Esta ele cria e repassa para seus filhos, e educandos. Esta frustração ele primeiramente aprende dos seus ancestrais, depois dá de presente aos seus descendentes. É assim, tem sido assim por muito tempo, se isso continuará de maneira indefinida, tempo adiante, isso, apenas nós, como multiplicadores de tradições, costumes e personalidades, somos capazes de dizer.

Perceber que a coisa ocorre desse modo, isso é o despertar da verdadeira inteligência. Só podemos ensinar se nos tornarmos inteligentes, ou então apenas seremos "instrutores", ou multiplicadores das deformações que já existem em nosso mundo. Ensinar a ser inteligente não é a mesma coisa que ensinar a repetir aquilo que já praticamos. Inteligência começa com questionamentos, com liberdade plena para duvidarmos, de tudo, de qualquer coisa.

Isso nos dará disposição para estarmos dispostos a nos transformar, não apenas porque diz a autoridade de alguém que deva ser assim, mas porque, pelo bom senso, percebemos que esse mundo, com suas incoerências e vícios, definitivamente, não é o modelo que desejamos para nossos filhos, e educandos, nem para os futuros herdeiros destes.

A Criança e os Vícios

 

Para uma criança, ávida para imitar alguém, qualquer influência, seja do lar ou de fora, deve ser medida com cuidado. Ter preocupação não é suficiente, é preciso criar no ambiente familiar um diálogo consistente, forte o suficiente para resistir às pressões dos comportamentos negativos que rondam todos os jovens.
Se observarmos com atenção, podemos perceber que nosso inteiro modo de olhar, de avaliar as coisas à nossa volta, é tendencioso e seletivo. Nossos olhos estão na verdade sempre procurando coisas que sejam do nosso agrado. Buscam as coisas que nos proporcionem algum tipo de satisfação, qualquer que seja, sejam por coisas bizarras, ou belas.

Satisfação é então uma coisa conhecida, coisa já experimentada antes, que faz parte de nossas lembranças. Provamos uma vez e se nos agrada, ficará classificada, rotulada em nosso cérebro como fonte de prazer. Não podemos desejar repetir uma coisa que nunca provamos antes, que ainda não classificamos como desagradável ou agradável.

E existe a primeira vez para tudo, mas apenas a partir da segunda vez, seremos capazes de desejarmos conscientemente aquela coisa, de elegê-la de forma pensada, consciente, como algo que nos desagrada ou agrada. E assim nascem nossas preferências, sejam elas de qualquer natureza.
  Se nunca provamos de certa fruta e ao provarmos, sentimos saciedade, satisfação, logo está criado um vínculo entre nós e ela. É um vínculo de prazer, e agora sabemos que ela existe para nos proporcionar algum tipo de satisfação.

Inicialmente, não existe uma relação entre indivíduos, ou objetos, sem que não exista entre eles um vínculo de prazer. Observe nosso tato, como prefere a superfície terna à crespa. Trata-se de uma coisa involuntária, um ato mecânico, instintivo. Basta observar uma criança bem pequena. Embora conscientemente ela não saiba por que, irá preferir o objeto suave ao invés do áspero, uma vez que áspero significa agressivo, perigoso, do ponto de vista da autopreservação, enquanto que o outro, representa segurança, conforto. A mesma regra se aplica ao nosso modo de olhar.

É complexa a fisiologia mental do homem, mas, ao contrário do que imaginamos, também a coisa bizarra, exótica, extraordinária, nos atrai. Trata-se de uma forma natural de confrontarmos, de avaliarmos aquilo que classificamos como belo. Sem o bizarro não existe o belo, assim como sem o trágico não existe a harmonia.

É de suma importância estarmos cientes desse fato. Na mente infantil ainda não existem lembranças suficientes para que um juízo perfeito, uma avaliação consciente de qualquer fato possa ser feita com o discernimento que nós adultos já possuímos. Assim, belo e bizarro, para elas, são quase a mesma coisa; o crivo das restrições para aquilo que classificamos como do mal ou do bem, ainda não está consolidado.

Como aprendem pela imitação, ao verem alguém contente, supostamente feliz a partir da experimentação de alguma coisa, especialmente se tais pessoas são de sua confiança ou do círculo de confiança dos seus entes mais próximos, sentir-se-ão naturalmente predispostas a praticarem a mesma coisa. Errado e certo é uma regra que não se aplica a sua mente fresca, ansiosa por novos experimentos, lugar onde as restrições não são bem vindas. Aprender a partir dos erros é a regra natural da sobrevivência, do instinto de preservação que trazem do berço.

Estarmos ciente disso, de que aquilo que julgamos errado ou certo se consolida em nós a partir das vivências pessoais, nos faculta a orientá-las desde cedo sobre o que é ou não necessário à sua experiência de vida, que não precisam cometer os mesmos erros, já antes cometidos por nós, para então descobrirem que aquilo não é coisa válida.

Existe coisa mais prazerosa para uma criança, quando descobre que não precisa falar sempre a verdade para sua mãe? Imagine que, com isso, ela é capaz esconder suas faltas e ainda receber compensações. Assim, ela pode muito bem dizer que fez a tarefa de casa, ou escovou os dentes, ou foi dormir cedo, por descobrir que sua mãe não tem meios de saber se ela está ou não dizendo a verdade. Essa descoberta, de que as palavras servem para ela esconder seus deslizes ou faltas, abre diante dela um imenso mundo de atraentes possibilidades.

Ela agora pode mesmo criar diante de sua mãe, uma falsa imagem a respeito de si mesmo, ou de qualquer outro, pois para isso, bastam as palavras. Mas isso ela só poderá ter aprendido observando outro, vendo como se faz, jamais sozinha.

E se antes ela temia seus pais com medo dos castigos prometidos, agora, desde que não seja pega em flagrante, estará a salvo. Mas a partir desse ponto precisará cultivar uma imagem, aquela que seus pais aprovam, e outra, aquela que eles não precisam saber que existe. E tudo isso ela aprende em casa, com seus próprios pais, irmãos e amigos, ou diante dos seus grandes instrutores modernos, a Televisão e a Internet.

E supondo que seus pais, ou irmãos, ou tios, ou amigos respeitados pelos pais, tenham um vício qualquer, como será que aquela criança reagirá diante dessa situação? Uma mente infantil é uma incógnita, e ao mesmo tempo uma coisa extremamente sensível, fortemente sujeita às induções, sugestões, especialmente se tais influências partem de pessoas que ela julga respeitáveis, ou nelas confia, ou foram aprovadas por pessoas que ela admira, como, por exemplo, seus pais, irmãos, ou melhores amigos.

Supondo ainda que seus pais não possuam vícios e em casa dão o bom exemplo. Mas suponha que os melhores amigos dos seus pais, que elas também, por empatia, acabem por respeitar, estes também poderão lhes servir de guias para construção do seu modelo de ética, bons costumes e preferências pessoais. Elas pensam: "se meus pais o aprovam, uma vez que abertamente nunca o contestaram, então a atitude deles é coisa certa...".

Por isso, bom exemplo é importante, mas não é suficiente. É preciso que além do bom exemplo, os pais se posicionem claramente, que são contrários a qualquer tipo de vício, do mesmo modo como fazem questão de ressaltar, diante de todos, tudo aquilo do que gostam.

 
A Criança Estressada


 

A obrigação de ter uma habilidade não compatível com suas predisposições, e as vezes desnecessárias ao seu bem estar profissional ou social, cria um tímido.
Criança não nasce estressada, ou agitada, ou malcriada, ela aprende tudo isso, com seus tutores, sejam eles pais biológicos ou secundários, que são seus primeiros e mais importantes educadores, seus primeiros instrutores.

Imagine que, na fase mais importante de suas vidas, que são seus primeiros anos de condicionamento mental, quando tomam conhecimento das principais fraquezas ou virtudes dos outros, quando através da identificação, da imitação, irão ou não adotar para si tais comportamentos, na maioria das vezes, as deixamos aos cuidados de qualquer um.

E estes primeiros instrutores, que até podem ser seus pais, ou computadores, ou televisores, colocarão dentro da mente de cada uma dessas crianças, suas manias, fraquezas, suas preferências, conflitos, e talvez, virtudes. E tudo isso servirá de base, lastro para a construção de suas personalidades, seu modo peculiar de ver e viver o mundo.
  Seus desejos, a raiz da maioria das frustrações humanas, também serão plantados nesse período. Ao se identificar com um personagem, que pode ser uma babá, um ídolo da moda, um educador, e tantos outros, a criança também se identifica com tudo que esteja relacionado com aquela pessoa. Isso inclui suas opiniões, seus gostos pessoais, suas crenças, seus ideais e assim por diante.

Se como adultos, já experientes, ainda julgamos os indivíduos pelas aparências, qual a reação que devemos esperar de crianças inocentes? A lógica é simples, elas se identificam com alguma coisa, porque nessa coisa, que podem ser objetos ou pessoas, buscam segurança psicológica, a sensação de que estão protegidas.

Uma criança nasce livre. Livre de crenças, de obrigações, sejam tarefas simples ou complexas. Não há vontade em suas pequenas mentes, estas, as suas vontades, nós lhes ensinaremos. Nos as ensinaremos a falar, a desejar, a preferir, a ficarem frustradas quando não conseguem obter aquilo que dizemos ser coisas importantes para elas. A importância das coisas, assim como suas reações diante de fracassos e sucessos, isso também lhes ensinamos.

O mundo não ensina a ninguém. O mundo não tem língua, nem é capaz de falar, muito menos de cuidar de uma criança. Isso é nosso papel, dos adultos, sejam pais, educadores ou qualquer outro. Como adultos, ensinamos a estas crianças como funciona nosso mundo, que logo será o mundo delas, que no futuro o será dos filhos destas, num ciclo infinito, aparentemente incapaz de ser contido, ou modificado.

Uma criança não nasce com raiva de alguma coisa, ou de alguém. Se como animal ela possui instintivamente, em si, a semente da violência, o modo como irá empregar essa violência em seus relacionamentos, este, fica por conta dos instrutores do mundo, ou seja, nós. Violência faz parte do instinto animal, serve como alicerce para a autopreservação. Faz parte do nosso medo primário, que é prudência diante dos perigos conhecidos.

Diante de um abismo, sabemos das conseqüências de uma queda, isso não é medo, é prudência, é inteligência. Ao cairmos desse mesmo abismo, segurar em suas bordas com todas as nossas forças, isso é colocar para fora todo nosso instinto animal de sobrevivência, e estaremos dispostos a tudo para lograrmos êxito. Aqui não se pensa, apenas se age, mesmo que nossos dedos sangrem, e mesmo a dor é ignorada. Isso é violência, é o despertar da força de sobrevivência interior, ou como diziam os antigos, o despertar do instinto primário.

A raiva é coisa dirigida, consciente, sabemos exatamente porque estamos com ela. É uma deformação do estado de violência primária, uma má aplicação causada pela falta de compreensão que temos desse estado natural. Ficamosinsatisfeitos com qualquer coisa, e naturalmente, logo desejamos nos livrar da causa ou causador. Assim nos foi ensinado, assim, de forma incondicional, também instruiremos aos nossos descendentes.

Ensinar as crianças que o perder faz parte do seu aprendizado diante da vida, que na verdade não se perde, só o podemos fazê-lo, se nós mesmos já compreendemos bem essa coisa. Como podemos ganhar alguma coisa se ainda não sabemos o que é perder? Imagine um mundo onde todos ganham; como saberão que são vencedores se não houvessem os perdedores, aqueles que precisam perder ao menos uma vez, para então aprenderem o que significa uma vitória?

Podemos ensinar isso às nossas crianças, o fato de que nada se perde, que o erro é imprescindível ao aprendizado. Como podemos ensinar o que é acerto se não tivermos um erro como referência? Decerto não podemos. Isso precisa ser compreendido, e explicado de uma forma clara, de modo que possam entender. Assim não mais temerão os erros, e cuidarão, naturalmente para que nunca se repitam. Usarão os mesmos como guias para seus acertos, sem frustrações, sem ressentimentos, sem raiva, sem ansiedades desnecessárias.
 
A Mente Infantil - Parte 1

 

Para criarmos na criança nova, uma nova mentalidade, primeiro não temos que ter em nós mesmos essa nova mente?
A criança não aprende a engatinhar, ela apenas pratica aquilo que já sabe, e isso ninguém a ensinou a fazer. Chama-se a isso de instinto, igual a sua capacidade de saber chorar ao sentir fome ou desconforto físico. Do mesmo modo, ninguém a ensina a ouvir, ou a ter paladar, ou a ser sensível ao tato, ou a ter a capacidade de enxergar.

Tudo isso são processos involuntários, que mais tarde, servirão de meios para que ela seja capaz de entender o seu mundo. Assim, a criança não aprende a sentir gosto pelos alimentos, ela aprende, mais tarde, a interpretar intelectualmente o que está comendo. A mesma regra vale para todas as demais situações onde os sentidos se façam presentes.
  Através da dedução lógica, o adulto acha que é capaz de imaginar, o que uma criança muito pequena está pensando; mas ele está enganado, pois, sendo ela muito pequena, ainda não pensa. E coloque-se qualquer objeto diante da mesma, e este será alvo de sua infinita curiosidade. O fato de ser naturalmente curiosa diante de qualquer coisa, não significa que possua uma vontade dirigida, voluntária e consciente.

Diante de qualquer objeto, motivada por uma curiosidade inata, ela tende a se sentir naturalmente atraída. Trata-se de puro instinto, sua curiosidade, nessa fase da vida, até por uma questão de ligeira adaptação ao mundo onde pretende sobreviver. Mas, isso tende a deixá-la vulnerável a todo tipo de influência externa, seja ela coisa má ou boa.

Sua mente ainda está limpa, não possui memórias suficientes, nem uma experiência prática para que seja capaz de elaborar pensamentos lógicos. Um pensamento lógico só pode surgir quando há experiência de qualquer natureza, uma vez que a ordem da lógica é resultado de uma comparação, medição, entre um meio conhecido, que são as memórias, e outra coisa, como um desafio novo, por exemplo.

Por instinto, a criança tende a se apegar rapidamente, mecanicamente, a qualquer objeto que lhe dê a sensação imediata de segurança física, pois segurança física é a única coisa de que necessita nesse momento. Ainda não sente medo, pois sua psique não possui memórias, lembranças de eventos vividos que a facultem lembrar de situações desagradáveis, ou atemorizantes. Também não sente necessidade de segurança psicológica, como os adultos, pois seu cérebro ainda não possui dados suficientes para isso.

A mãe é um desses objetos, ao qual ela se apega, uma vez que participa do seu bem estar, lhe dando alimento, conforto físico, aliviando seu stress, e tudo isso significa segurança física. Seus primeiros brinquedos tendem a atrair sua atenção, não porque sejam bonitos, ou interessantes do ponto de vista estético, ou engraçados, uma vez que todos esses conceitos são conclusões do intelecto, de uma mente que pensa, coisa que ela ainda não é capaz de, conscientemente, fazer.

Mas, para seus sentidos, o toque em objetos é coisa que a conforta, e quanto maior a quantidade de sentidos que ela possa trabalhar, exercitar, ao mesmo tempo com aquele acessório, mais atração e apego sentirá pelo mesmo. Ocorre que involuntariamente, sem que ela pense, seu cérebro primitivo, onde estão gravadas as instruções básicas de sobrevivência, ordenará que seus sentidos sejam testados, a todo instante. Daí sua enorme necessidade de pegar e sentir tudo que está à sua volta, sem preconceitos, sem cuidado algum, sem receios.

Usar os sentidos à exaustão, é o preparo base que sua psique precisa nesse momento. É lá onde serão gravadas informações essenciais, tais como, aquilo que é coisa desagradável e coisa agradável. Esse é o ponto de onde sua inteira personalidade será traçada. Daí nascerá o modo de comportar-se daquele indivíduo, a forma como interpretará o mundo e o modo como aparentemente "esse mundo" funciona.

Ao apegar-se a um objeto, brinquedo ou qualquer outra coisa, ela começa a desenvolver sua memória lógica, e logo sentirá necessidade de repetir aquela experiência sensorial com o mesmo. A repetição é necessária porque o cérebro precisa disso para ser capaz de gravar uma informação de forma definitiva. Por isso, irá preferir mais uns que outros, e os preferidos serão aqueles que ofereçam mais recursos, isto é, que sejam capazes de exercitar mais de um sentido ao mesmo tempo.

Sentir-se-á segura ao depender daquele objeto, pois sua mente já começa a construir um ponto seguro sobre o qual pretende se apoiar. E o objeto se torna seu conhecido, e o fato de repeti-lo muitas vezes, na sua mente, faz iniciar o processo de identificação pessoal com seu mundo. E sua personalidade começa a se formar, e também suas preferências, tudo isso a depender da sensação de conforto, ou prazer, que o objeto lhe proporciona.

A partir desse ponto, ela começa a comparar a sensação obtida com aquela experiência, com as demais que terá daí por diante. Pode ser um timbre de voz, uma música, um gesto tátil de carinho, um som desagradável ou agradável, um temor, e assim por diante.

Como ela nada conhece desse mundo novo, só é capaz de aprender através da imitação, por isto repetirá dos adultos, seus costumes, manias, medos, alegrias, vícios, tristezas, e tudo o mais. E mais uma vez, precisará repetir cada uma dessas coisas até fixar bem como memória definitiva em seu cérebro. Cria-se assim um novo indivíduo, cresce um novo veículo humano, mas com a mesma antiga mente que os adultos já possuem.

Por isso mesmo, nós, como adultos e educadores, conscientes desse fato, podemos criar esse novo indivíduo, com uma nova mente, sem repetir nossos velhos vícios, medos e amarguras. Ou podemos simplesmente, ignorar o fato, e apenas repetir a mesma e antiga mentalidade, com suas deformações e incoerências; repetir o mesmo padrão de violência e insensatez que conhecemos bem, enfim, repetir o mesmo "pensamento" que já criou o atual modelo de mundo onde vivemos.


 

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